quarta-feira, 24 de maio de 2023

Engula Esse Choro e Aprenda a Não Reivindicar


Engula Esse Choro e Aprenda a Não Reivindicar

Em um dia ímpar alguém veio me falar sobre a “qualidade do choro”. Fiquei intrigado com essa afirmação como se existisse um ranking de choros, com protocolos e tutoriais de como uma criança pode ou não pode chorar. Como se alguém falasse para você “o seu filho não está chorando de forma adequada”.

Na prática clínica aprendi a não ranquear a dor dos cliente, não tenho o direito de falar que alguém está sofrendo mais que o outro, cada história é única com seus personagens, ângulos e temporalidades. Creio que o choro siga esta mesma premissa. Como posso ficar diminuindo choro de outra pessoa? Ainda mais de uma criança, que ainda esta aprendendo como se expressar.

Claro que sei que o choro alheio nos incomoda, evolutivamente essa é uma de suas funções, incomodar para alertar sobre um iminente perigo e isso é um dos fatores que garantiu a nossa sobrevivência, nossa prole está com um problema e utiliza um sinal sonoro para nos alertar, é instintivo, e como somos animais que vivemos em sociedade é muito difícil ignorar o choro alheio, muitos aprendem a disfarçar, mas se você não se importa com ele pode ter algo de errado.

Então se a criança está chorando, muitas vezes reprimimos este choro, com a máxima “só bebês choram” ou frases similares. Porém, adultos choram ou pelo menos deveriam chorar, tanto de tristeza como também de emoção. Quantas vezes chegam adultos no consultório que dizem não saber chorar, quando será que isso foi reprimido? Outros quando o fazem chegam a me pedir perdão, como se fosse algo errado. Mas se sempre carregamos lencinhos em nossos atendimentos, isso é uma prova de que ali é um bom lugar para chorar. E quando conseguem, eles têm um contato profundo consigo mesmo e é maravilhoso essa tomada de consciência, afinal, tem que ter muita coragem pra chorar (ainda mais na frente de outro ser humano). Pois ele muitas vezes é associado a fragilidade, e crer nessa conexão é um equívoco.

Voltando ao caso das crianças, deixem elas chorarem, você pode consolar, oferecer um copo d’água, mas não deveriam reprimir, outra razão para se deixar chorar, pois é uma ótima oportunidade para que aprendam a lidar com a frustração, e também aprendam que eles podem e devem chorar, mas não como uma forma de barganha, mas por que é saudável é benéfico para uma autopercepção.


Esse conselho serve não apenas para aplicar aos seu filho e respeitar seus momentos de choro, mas também para que você mesmo respeite seu choro, afinal, Seu filho um dia te fará chorar (depois eu falo melhor sobre isso). Chorar elimina poeira e outros resíduos dos seu olhos; Ele libera endorfina que ajuda a lidarmos tanto com dores físicas como emocionais, chorar lubrificar seus olhos protegendo de infecções, Ele ajuda a elevar o seu humor, pois funciona como um regulador térmico, ele aumenta atividade do sistema nervoso parassimpático que te ajudará a se acalmar, e por último ele é extremamente importante para se conseguir elaborar o luto.

Aproveito esta última informação para concluir esse texto: nosso primeiro sinal de vida é quando choramos, neste mesmo instante nossos pais choram emocionados, e em nosso último momento de existência nossos filhos estarão chorando por nós. Então por que negar ele no resto da jornada?

Rio de Janeiro, 16 de dezembro de 2019.

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